Carta Testamento

By PCN

Era noite e lá fora fazia frio. Ele só conseguia ouvir o barulho de seu cachorro, provavelmente procurando algum canto no quintal para tirar uma soneca. Ele havia pensado a semana inteira no que estava planejando fazer. Desatou a escrever uma carta:

“Querida Flávia.
Qual o problema de se apaixonar? Vi a cara de deboche das suas amigas quando declarei meu amor por você, mas isso não me afetou tanto quanto seu olhar de desgosto, de nojo. Nojo de mim, logo eu que te ouvi por tanto tempo? Eu despertei isso em você? Minha presença é tão negativa assim? Peço perdão. Perdão por ter me apaixonado, por ter feito isso tudo passar de simples amizade.

Te conheço a alguns meses. Aos poucos fomos nos tornando amigos. Você logo percebeu que eu era um bom ouvinte, e começou a compartilhar comigo suas aflições, medos, angustias e amores. Eu sei tudo sobre você, você já faz parte de mim. Fico feliz quando você está feliz, e o contrário também. Pra você, eu não passo de um amigo (talvez agora nem isso), mas pra mim já era mais que isso. Logo o meu “Eu” foi anulado, em sua função.

Fui cego. Me iludi com seu carinho, com seu jeito de me tratar, com suas palavras de despedida. Não percebi que o “eu te amo” hoje em dia é completamente banalizado, inclusive por você. Meu amor foi aumentando, aumentando... E explodiu no dia em que me declarei na frente de todos. Esse foi meu maior erro, talvez. Eu devia ter me contido, não consegui. Descobri que sou um daqueles desafortunados que nasceram pra ser sozinhos, e não quero isso pra mim.

Meu amor por você, embora tenha nascido de forma completamente errada, é muito grande. Ele é maior que tudo, maior que todos, maior que eu. Apesar disso, é muito pouco pra você, não é mesmo? Você merece mais! Vivo aquela triste ironia na vida: Eu não mereço seu amor, mas também não mereço viver sem você. O que fazer então? Não tenho lugar nessa mundo, então acho que devo achar meu lugar em outro.

“Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História” – Escreveu um grande político brasileiro. Eternidade? História? Só se for para você, meu amor. Depois disso, você nunca mais vai me esquecer. Depois disso, deixarei minha marca mais profunda em você. Ficarei marcado para sempre em sua memória, e isso é o que eu mais quero no momento.
Adeus Flávia, amo você.
Igor.”


Como faria? Ele não sabia, só estava decidido em fazer. Só tinha que colocar a carta nas correspondências dela. Saindo de casa em silêncio, tomando cuidado para não assustar seu cachorro, pensou se aquilo tudo valeria a pena. Sem respostas, ele só conseguiu concluir que o amor não é tão racional quanto as pessoas imaginam ser...
 

No Metrô

By PCN

Sua rotina era sempre a mesma: Acordar, banho, tomar café, ônibus, metrô, trabalho, almoço, trabalho, metrô, ônibus. E parecia que dessa vez não seria diferente.

Seus períodos entre a rota casa/trabalho eram sempre regados a muita musica oriundas de seu celular. Sempre que ele estava ao lado de alguém ele invariavelmente acabava chamando a atenção, pelo som alto de seus fones de ouvidos. Ele nunca se preocupou muito com isso, afinal numa cidade grande incomodar ou não uma pessoa não é tão importante assim.

Porém daquela vez, o trocar de música, sentiu um leve empurrão involuntário da passageira ao seu lado (“o que é isso? Ela está gostando da musica e está querendo dançar?”). Instintivamente olhou pra pessoa. Era uma moça linda, cabelos escuros e negros, olhos verdes e brilhantes (“como não reparei nela antes?”). Ela cantava cada refrão daquela desconhecida musica saída dos gastos fones de ouvido com uma alegria que raramente se vê.

Extasiado, ele não sabia o que fazer. Amor a primeira vista ou apenas um leve e inesperado interesse? Ele não sabia dizer. Teve vontade de compartilhar seu fone com ela, mas se perguntou se ela não acharia isso bobo demais. Queria conversar com ela, saber seu nome, ouvir sua voz, mas ele simplesmente estava muito travado para isso (“oras, nunca me senti assim com uma desconhecida!”)

Seguiu confuso por diversas estações, apenas a vendo murmurar baixinho cada faixa tocada em seu celular. Ela já o encarava com um olhar estranho, como se fosse uma criança curiosa vendo algo novo e diferente. Ele se cansou de sua apatia, tomou coragem, abriu a boca...

*Estação Carrão!*

Ela se levantou e, com um sorriso no rosto, desembarcou. Logo ele se viu em sua própria fúria (“Droga! Por que demorei tanto? Sou muito burro, como pude pensar que ela ia ficar ai pra sempre?!”)

- Moço? – Assustado, olhou para ver quem estava falando com ele. Era uma senhora que acabará de entrar, ela ia se sentar no lugar da moça que estava ao lado dele.
- Oi? – respondeu.
- Isso aqui não é seu? – A senhora apontou para um cartão que estava largado no banco.

Ele pegou o cartão. No cartão podíamos ver a foto de uma bela mulher de cabelos escuros e olhos verdes, o nome de um escritório, um endereço, um número de telefone e um nome: Mariana. Feliz, guardou o cartão e esperou sua estação chegar.
 

Maldita seja nossa geração.

By PCN

Maldita seja essa geração sem ideologia, sem propósito, sem desejos por mudanças.

Maldita seja essa geração em que todos usam roupas espalhafatosas, cabelos malucos, cantam musicas dançantes, sem saber os motivos para se estar fazendo isso.

Maldita seja essa geração onde todo mundo só sabe criticar, mas não sabe usar argumentos para fundamentar suas criticas. Onde todo mundo repassa informação erradas para frente, sem nem ao menos saber do que se está falando.

Maldita seja essa geração em que quase todos os jovens possuem a chance de ter todo o conhecimento do mundo na ponta dos dedos, e simplesmente não usa.

Maldita seja essa geração onde as pessoas não ligam mais para o que as outras estão sentindo, onde “machucar o sentimentos dos outros” virou sinônimo de felicidade.

Geração burra, inconsciente e sem sentido.

Cansei.